quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Mazelas de Menina


           Viver era-lhe insípido, tentara empunhar a si mesma ao trágico fim que para então fazia-se unicamente solução. Inserida em um vestido finalizado na medida dos joelhos, bege ,de seda elencado por pobres rendas periféricas e alguns buracos indesejados, a boca apresentando-se com erosões labiais que o vento construira nos últimos dias. Seios belos e livres sob a veste. Estava descalça pisando sobre as pedras camonianas e o abismo à frente mantinha o convite. As pedras que a acolheram em melhor época de sua vida, os estudos e livros, faziam o mesmo na pior delas. Havia sido rodeada de falastrões – mãe, companheiro, irmão – eis a semente: não ofereceu flores, apenas espinhos e com exceção do profundo convidativo em que estava à mercê, escolhida por ela mesma. Ventava, ventava em uma fúria calma. Não havia frio, não climático; e a leve brisa apenas a estimulava. A morte representava-lhe o alcácer.  Rosália era de uma cor celeste diária de abril em presença do sol. Coração puro e olhar perdido, era início da manhã e da concretização de um desejo que crescera: Rosária matar-se-ia. Cansou das tantas vozes. Estava parada, em meio à sua confusão e aparentemente decidida. Arrostava a situação em sua mente, as memórias reboavam: suas leituras, tão abstratas e sua única verdade. Queria se matar, Rosália. Unhas descuidadas, o cabelo longo de castanho acinzentado e os olhos... estes sim, gritavam por sentido – o qual fazia-se naquele voo planejado, construído. Como uma águia, rumo ao mar. Jogar-se-ia, decididamente. As diversas literaturas pintalgavam seu pensamento inconcluso. Rosália desensarilhou o que levaria no pulo, o melhor lido, o resto ficaria nas pedras e ao mundo.
 Berço das dores, algo copioso.
             Quis diferença, não teve, quis diferente.
        Seu conhecimento basco, estudos de latim, literariedades longínquas. Recordou-se do aroma do marido, enquanto agradou-se em acariciar suas junturas com a língua, a mesma que sabia ainda francês. Seus olhos de anil traziam a moléstia crucial: sintomas de antivida.
            Estática, postada ao final do pisável e com o olhar suicida, tomaria sua atitude. Poderia realizar inúmeras leituras. Com a mente em liça, Rosália fita o mar sem fim.

10 comentários:

  1. Seu texto tem muito de prosa poética....
    Encanta!!

    ;D

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  2. Sim, um tanto de Simbolismo com melancolia. (:
    Que bom que gostou.

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  3. O homem e odesejo da morte. é complicado compreender na cabeça de uma pessoa que toma essa decisão, só quem eu memso tive uma época que não achava que era desse mundo. Paseva pelas passarelas e olhava a pista e os passando achando que assim seria uma morte bem trágica. mas também machucaria muito minha família. Até que tomo todos os comprimidos de do remédio de baixar pressão da mimnha mãe e paro no hospital. Me arrependo muito de ato. pois aminha ficou com medo escondeu o remédio, passou a não tomar o medicamento e teve um AVC. Eu sempre vou levar essa culpa. Era melhor antes ter morrido.

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  4. Entendo. Mas o que eu escrevi é literário, sem comprometimento com a realidade. Não sou assim, e nem mesmo sei se minha personagem matou-se ou não.

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  5. Certamente *-*
    Como eu vou deixar de seguir uma pessoa que escreve tão bem ?
    Vou seguir para acompanhar o andamento de seu blog!

    Até mais *-*
    Parabéns pelo bom uso das palavras!

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  6. Muitíssimo obrigado pelas palavras gentís. (:

    Até logo.

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  7. Teu texto, sinceramente, é muito bom. Amei, me encantou!

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  8. Rodrigo...Vim agradecer e retribuir a visita mas gostei tanto que com certeza voltarei...Vc tem alma de escritor...Sucesso amigo..!

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  9. Fico feliz por isso, obrigado pelas palavras.
    Sucesso pra nós!

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